Muse no Allianz Parque - 24/10/2015

 O Brasil anda sendo injusto com o Muse. Em 2014, a apresentação do grupo no Lollapalooza foi prejudicada pela garganta inflamada do vocalista Matt Bellamy. Em 2015 parecia que tudo ia ser sensacional - o primeiro show solo no Brasil!, porém o salgado preço dos ingressos, o fato de que o show foi marcado para o mesmo fim de semana do Exame Nacional do Ensino Médio (precisamos aceitar o fato de que boa parte dos fãs da banda estão em idade de prestar o exame), a concorrência com outros shows (Los Hermanos, Tarja e Skillet) que estavam acontecendo na cidade no mesmo dia e o tamanho (um estádio cujo primeiro show foi de Paul McCartney!) do local do evento contribuíram para a baixa venda de ingressos, que acabaram sendo colocados em promoções generosas para evitar o flop do evento.

Porém, o Allianz Parque estava indiscutivelmente meio cheio (ou meio vazio, para os mais pessimistas). Segundo a produtora, 27 mil dos 31 mil ingressos colocados à disposição do público foram vendidos, mas era possível perceber buracos na pista e nas arquibancadas. Isso não desanimou a banda, que fez uma performance para encher os olhos e os ouvidos, muito ajudada pela excelente acústica do local, que deixa no chinelo os terríveis Arena Anhembi (que, dependendo da posição que o palco é montado, deixa o som ainda mais baixo) e Estádio do Morumbi (o som do Foo Fighters no início desse ano estava tão baixo que era possível conversar tranquilamente com os amigos enquanto a banda tocava). Decididamente o Allianz é o melhor lugar aberto em São Paulo para se assistir a shows: bonito, com acústica boa, confortável e relativamente bem localizado.

Pouco após as 21h15, as luzes do estádio se apagam e o telão se ilumina, com a introdução "[Drill Sergeant]", que precede "Psycho", uma excelente canção pé na porta que começa com um riff poderoso e pesado, beirando o heavy metal, e possuidora do melhor refrão do ano - "your ass belongs to me now!". Os vocais de Bellamy são idênticos aos do álbum, assim como o som, extremamente competente para um power trio ajudado por apenas um tecladista. "Reapers", outra faixa de Drones, álbum mais recente da banda, produzido por Robert "Mutt" Lange, que esteve por trás da mesa de som em álbuns insignificantes como Back in Black e Highway to Hell, do AC/DC, e Pyromania e Hysteria do Def Leppard, tem um riff que lembra estranhamente "Sticky Sweet", do Mötley Crüe, de uma forma mais preenchida.

"Plug In Baby", do segundo álbum da banda, Origin of Symmetry, tem um clima contagiante gostoso que aquece o coração e faz os presentes pularem e cantarem junto, dando ao show ares de celebração - e é mesmo, já que os fãs celebram a primeira turnê solo do grupo no país. O Muse prefere fazer uma apresentação mais direta, destilando músicas uma após a outra, sem muita enrolação, interagindo pouco com a platéia e honrando o tempo de seu setlist não muito extenso. O começo orquestral de "The 2nd Law: Unsustainable" dá lugar a batidas e riffs que beiram o dubstep, fazendo muitas meninas dançarem como se estivessem na balada. Depois, mais uma música nova: "Dead Inside", faixa de abertura de Drones, cuja batida me lembra muito algo do Def Leppard, como "Pour Some Sugar on Me".

A próxima música foi a linda "Resistance". Achei o setlist muito bem escolhido, pois mesclou músicas pesadas com outras mais suaves, como essa, com uma linda introdução de piano e um refrão romântico. "Muscle Museum", do álbum de estreia do grupo, Showbiz, comoveu os fãs mais radicais. "Citizen Erased" tem um riff muito legal, pesado, contrapondo com momentos mais suaves. O baixista Chris Wolstenhome e o baterista Don Howard se juntam em uma jam muito legal, mostrando de onde o Royal Blood tirou muitas de suas influências, e os abundantes efeitos visuais dos telões dão lugar a uma espécie de lyric video de "Madness", outra música muito bonita, na qual Bellamy abusa da pose de rockstar de um jeito bem carismático.

A sequência de sucessos absolutos do setlist começa com a animadíssima "Supermassive Black Hole", fazendo todos os presentes pularem, dançarem e cantarem juntos; esse clima continua em "Time is Running Out", com uma contagem regressiva no telão. O momento de animação é substituído por comoção na maravilhosa "Starlight", conduzida pelo piano e grandiosa em sua essência simples de canção de amor. A autoritária "Uprising" é a escolhida para fechar a primeira parte do show, com bolas gigantes caindo da arquibancada em direção à pista e soltando uma chuva de papel picado quando estouradas.

O grupo volta para o palco com "Mercy", em uníssono, já com um certo clima de despedida em suas notas. Uma chuva de confetes e serpentinas sai do palco, produzido um efeito lindo tanto para quem via de perto quanto de longe. Uma gaita soa solitária, e começa a magnífica e derradeira "Knights of Cydonia", um verdadeiro épico de resistência e luta, que despede o grupo de seus fãs paulistanos.

Um show grandioso, com belo impacto visual, excelente qualidade técnica e sonora, feeling e que funciona bem tanto de longe quanto de perto não se vê com tanta frequência assim. Entrei no estádio curiosa, saí uma futura fã, e pode ter certeza que estarei em algum de seus shows futuros. Com certeza foi muito melhor do que um certo show que acontecia ao mesmo tempo...

Crédito da foto: Gabriel Quintão / Virgula


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