Cathy no Monsters of Rock - 25/04/2015

Assim que foi divulgado, no fim do ano passado, o lineup do Monsters of Rock já causou controvérsias. As reclamações vieram de todos os lados - afinal, não tem como um único festival agradar a todos. Porém, não se pode negar que os headliners estavam atrativos: Ozzy Osbourne no sábado e Kiss no domingo. Resolvi ir aos dois dias, porque não dispenso uma oportunidade de ver o Madman ao vivo, e Kiss é a minha banda preferida.

A escalação completa do sábado foi a seguinte: De La Tierra, Primal Fear, Coal Chamber, Rival Sons, Black Veil Brides, Motörhead, Judas Priest e Ozzy Osbourne. Só os três nomes principais já impunham respeito e identidade ao evento: três das maiores bandas do heavy metal britânico tocariam no mesmo dia, no Brasil. As representantes do rock atual eram De La Tierra, a nova banda de Andreas Kisser, guitarrista do Sepultura; Rival Sons, uma banda atual que faz um hard rock na melhor linha anos 70, bem ao estilo do Led Zeppelin; e Black Veil Brides, uma banda de metalcore que começou a ter associação com a cena glam metal em seus lançamentos mais recentes. O Primal Fear é uma banda de power metal formada por um ex-membro do Gamma Ray, e o Coal Chamber toca nu metal.

Primeiro, é preciso esclarecer uma coisa: no Brasil, para ir a um evento desse porte, você não gasta menos de R$ 200. A meia entrada do segundo lote custava R$ 190 sem a taxa de conveniência - e ainda tem o dinheiro que se gasta com condução, comida e lembranças do evento. Não é pouco. Por um valor tão alto, o mínimo que se espera é que a produção invista em organização e no conforto dos presentes. Na edição de 2013 do Monsters, eu cheguei lá às 16h (por conta do metrô, a linha amarela estava fechada), não peguei fila para entrar e fiquei em um lugar ótimo - na grade da passarela que o Aerosmith usou para fazer a maior parte de seu show. Achei que nesse ano não haveriam maiores transtornos.

Como eu queria ver o show do Rival Sons, programado para as 15h50, tentei chegar lá às 15h30. Por conta do trânsito, cheguei às 16h e encontrei uma fila IMENSA, que andava a passo de tartaruga. Até eu conseguir entrar no Anhembi, transcorreram DUAS HORAS. DUAS HORAS. Obviamente, não consegui ver o show do Rival Sons, nem o do Black Veil Brides. E a fila para usar o banheiro da arena também estava imensa, já que só tinham dois banheiros femininos abertos, e sem papel higiênico, claro. A cerveja custava R$ 9 (preço abusivo, já que uma latinha de Budweiser no supermercado não passa de R$ 3), e apesar de não ser permitido entrar com latas e garrafas "por motivos de segurança" era vendida na lata mesmo, e por R$ 10 em alguns pontos, porque os vendedores alegavam não ter troco.

Na hora em que eu entrei, não estava rolando nenhum show. Eu não sabia, mas tinha acabado de acontecer um momento desprezível no palco: o Black Veil Brides, banda mais nova do festival, tinha encerrado seu show após apenas 30 minutos, por conta das vaias dos fãs ensandecidos que clamavam pelo Motörhead. É necessário comentar esse ocorrido, porque foi uma falta de respeito absurda e me deixou envergonhada, mesmo não estando presente. Eu não gosto do Black Veil Brides e não vibrei quando soube da escalação deles para o festival (assim como não vibrei com a escalação da maior parte das bandas do domingo, mas isso é assunto para outro post), mas jamais passaria pela minha cabeça vaiar uma banda que está ali fazendo seu trabalho honestamente. Isso é uma falta de respeito com o artista e também com os fãs, que pagaram o mesmo preço que você pelo ingresso e tiveram sua experiência arruinada. Gostaria de pedir desculpas aos fãs do Black Veil Brides e à própria banda por terem que passar por essa experiência horrível. Se você não gosta de uma banda, mas mesmo assim vai ter que ver o show dela, siga o meu exemplo e de todas as outras pessoas sensatas do universo: vá ao banheiro, tome uma cerveja, fique no celular, ou simplesmente assista o show calado. Comente com o amiguinho do lado (se ele também não gostar da banda), afinal ninguém é obrigado a gostar de nada, mas não estrague o show dos outros. Sempre trate os outros como gostaria de ser tratado.

Depois desse momento, todos esperavam pelo Motörhead, claro. Ninguém contava que alguém da produção aparecesse no palco e noticiasse que Lemmy Kilmister, o vocalista, baixista, ícone e lenda do rock estava passando mal e não poderia fazer o show. Eu estava ansiosíssima pelo show deles (inclusive estava usando a camiseta da banda) e entrei em estado de choque, como boa parte dos presentes - a estampa do Motörhead, junto com a do Black Sabbath, era a que mais se via na Arena Anhembi. Foi anunciado que o Judas Priest, próxima banda, tocaria um setlist maior, e que o Sepultura estava pronto para entrar no palco com Mikkey Dee e Phil Campbell (o baterista e guitarrista do Motörhead, respectivamente) e tocar algumas músicas para os presentes.

Primeira consideração: o som estava baixo DEMAIS. Chegava a ser ofensivo estar em um festival chamado "Monsters of Rock" no qual você conseguia conversar tranquilamente com a pessoa que estava ao seu lado enquanto rolava um show do que viria a ser o Motörhead (a parceria entre eles e o Sepultura durou três músicas - "Orgasmatron", "Ace of Spades" e "Overkill", e podia-se ouvir bastante gente cantando junto com certa empolgação. Não consegui entrar nesse time e confesso que chorei de tristeza ouvindo "Ace of Spades", uma das minhas músicas preferidas da vida, sendo entoada por alguém que não é o Lemmy).

Eu esperava que o show do Judas Priest fosse antecipado, mas isso não aconteceu. Por volta das 20h50, Rob Halford, Glenn Tipton, Richie Faulkner, Ian Hill e Scott Travis subiram ao palco para a melhor performance instrumental ao vivo que eu já ouvi na vida. Com um setlist recheado de clássicos, os monstros do heavy metal demonstraram a combinação perfeita entre peso e técnica. A dupla de guitarras do Priest, originalmente formada por Glenn Tipton e K. K. Downing, se tornou conhecida por tocar dobrado - exatamente as mesmas notas em duas guitarras diferentes, produzindo um som mais afiado e pesado. Ian Hill é excelente nas quatro cordas, formando junto com a potente bateria de Scott Travis uma cozinha brilhante e polida. Para complementar e fazer a diferença decisiva no som da banda, está a voz do sr. Halford, o próprio Metal God, o melhor vocalista de heavy metal de todos os tempos, juntamente com Ronnie James Dio, na minha lista. Halford vai do gutural ao agudo em questão de segundos, e mesmo do alto de seus 63 anos canta as músicas do Priest com a mesma precisão, entonação e vigor que se ouve nos álbuns de estúdio. É admirável vê-lo cantar.

Em shows de certas bandas, há uma certa mística a ser seguida - Rob troca de roupa várias vezes durante o show, usando jaquetas de couro com muitas aplicações de tachas (ele inventou a estética do heavy metal se baseando nos figurinos sadomasoquistas), coletes de motoclube personalizados e uma jaqueta prateada que eu invejei. E, é claro, no início de "Hell Bent for Leather", sobe no palco montado em uma Harley Davidson, fazendo com que todo o público escute o delicioso ronco dos motores. O setlist misturou clássicos como "Metal Gods, "Breaking the Law", "Victim of Changes", "Electric Eye", "You've Got Another Thing Comin'", a absurda "Painkiller" (para mim a melhor faixa de metal já escrita, com sua introdução metálica de bateria e um riff poderosíssimo, acompanhado dos rasgantes agudos de Halford) e "Living After Midnight" com faixas mais novas (e não menos boas), como "Dragonaut", "Halls of Valhalla" e "Redeemer of Souls", do último lançamento da banda, Redeemer of Souls, de 2014. Me surpreendi com a presença de "Love Bites" e "Turbo Lover", faixas que são notavelmente mais pop do que o resto do repertório do grupo, mas não deixei de me empolgar. A performance espetacular do Judas me ajudou a esquecer, mesmo que por algum tempo, a tristeza de não ver o Motörhead.

Ozzy Osbourne, o Príncipe das Trevas, subiu ao palco pouco depois do horário marcado, 22h30. Abrindo o show com nada menos do que "Bark at the Moon", para empolgar mesmo os presentes, o Madman esbanjava simpatia e fôlego (ainda mais para aqueles que sabem do seu histórico com as drogas e se perguntam como diabos ele ainda está vivo). Dividindo o setlist entre músicas próprias e do Black Sabbath (ele tocou "Fairies Wear Boots", "War Pigs", "Rat Salad", "Iron Man" e "Paranoid", todas do clássico absoluto Paranoid, de 1970), Ozzy mostrava realmente estar se divertindo. Interagia com o público a toda hora, pulava de um lado para o outro e fazia suas brincadeiras características, além de estar munido de uma enorme mangueira e esguichar água nos fotógrafos e pessoas que estavam na grade (Alckmin e os habitantes de São Paulo não curtiram isso, Ozzy!). O setlist foi emocionante, mesmo com a ausência de "No More Tears", seu maior sucesso solo, que não é tocado ao vivo desde 2010. Músicas que eu amo, como "Mr. Crowley" (em que Ozzy regeu a platéia), "Suicide Solution", "Shot in the Dark", "Road to Nowhere" (uma das melhores performances vocais do Madman, na minha opinião) e "Crazy Train" tem um apelo especial ao vivo, ainda mais porque Ozzy sempre fez questão de ter ótimos músicos ao seu lado. Gus G é o guitarrista que substituiu Zakk Wylde em 2009, Tommy Clufetos esteve no lugar de Bill Ward na turnê de 13, último álbum do Black Sabbath (e cumpriu seu dever com maestria, sendo um dos melhores bateristas que eu já vi ao vivo) e Rob Nicholson e Adam Wakeman não ficam para trás.

Apesar de curto (o show só teve 13 músicas - o setlist divulgado, com 15, contava com "Fire in the Sky" e "Mama I'm Coming Home", que infelizmente não rolaram), o show de Ozzy foi incrível. O fato dele ser uma lenda é um motivo especial para prestigiá-lo - aquele senhorzinho maluco de óculos redondos e roupa preta ajudou a inventar o heavy metal e nós podemos vê-lo cantar! Em todos os shows que Ozzy fizer no Brasil, seja lá por quanto tempo continue vivo, terá minha presença.

Saldo de primeiro dia de Monsters: organização péssima, decepções nas atrações, mas dois shows maravilhosos, dignos de monstros do rock. Aguarde a próxima parte!


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