Resenha: Kiss - Kiss (1974)

Que o Kiss é uma das minhas bandas preferidas, muitos já sabem. E, gostando ou não, é indiscutível que o quarteto mascarado de Nova York mudou a história do rock para sempre com suas maquiagens características, o show performático e o fanatismo desarvorado dos fãs - que são um exército, já que o fã-clube oficial do grupo se chama Kiss Army e está em atividade desde 1975.

O Kiss também é conhecido por transitar entre diversos subgêneros do rock, apesar de ser mais comumente encaixado no rótulo de 'hard rock'. Em 1974, a cena em Nova York era dominada por garotos de vestido e cheios de maquiagem, influenciados pelos New York Dolls, precursores do punk, e Lou Reed, que andava muito com Iggy Pop e David Bowie na época; sendo Kiss um autêntico disco de glitter rock (nada mais do que um típico rock n' roll dos anos 1960, despido de todos os excessos trazidos pelo virtuosismo da década de 70, mas questionando os papéis de gênero, simplesmente para chocar a sociedade).

A formação que gravou este álbum é a clássica: Paul Stanley ("Starchild") nos vocais e guitarra, Gene Simmons ("The Demon") no baixo e vocal, Ace Frehley ("Spaceman") na guitarra solo e Peter Criss ("Catman") na bateria e vocal. A maioria do material foi composto por Stanley e Simmons durante seu tempo no Wicked Lester, grupo pré-Kiss do qual eles faziam parte, e é considerado clássico entre os fãs do grupo hoje em dia.

O álbum abre com "Strutter", um delicioso hard rock que fala sobre uma garota metida com um riff simples, porém contagiante. A faixa seguinte, "Nothin' to Lose", tem vocais de Gene Simmons e Peter Criss (que tem uma voz extraordinária para baladas românticas, tendo demonstrado seu talento em algumas das melhores de amor do Kiss) e uma letra safada, que provavelmente serviu de inspiração para todas as bandas de glam metal dos anos 1980, com sua referência indireta ao sexo anal. "Firehouse" tem a pegada clássica dos anos 1970 - ao ouvir o riff, é quase possível fechar os olhos e imaginar ouvir isso no toca-fitas de um carro com os amigos, na época em que o Kiss era a maior banda do mundo, em seu auge.

É necessário frisar o talento de Ace Frehley: outros tantos guitarristas já passaram pelo Kiss (inclusive músicos incríveis, como Vinnie Vincent), mas nenhum deles igualou o trabalho de Ace. Seu estilo é contagiante, selvagem e frenético, e é realmente uma pena que seus problemas com o álcool e as drogas impediram a continuidade de sua carreira dentro da banda. Falando em Frehley, temos "Cold Gin": foi a primeira música escrita por ele no Kiss, e ele diz não ter se sentido seguro para cantá-la, deixando Gene Simmons cumprir a tarefa (Ace só iria cantar em Love Gun, três anos e cinco discos mais tarde); e é considerada uma das melhores músicas para encher a cara no rock n' roll.

"Kissin' Time" foi incluída no álbum depois de seu lançamento original, com a esperança de que um single mais pop fizesse a banda emplacar nas paradas. É um cover de pop do final da década de 1950, e não alcançou posição maior do que 83, mas de fato aumentou as vendas, mesmo contra a vontade da banda de que estivesse presente no álbum. Logo após essa contrariedade, está "Deuce", um clássico absoluto, até hoje requisitado nos shows do grupo (foi usada como música de abertura nos shows das turnês entre 1973 e 1975, e depois na turnê de reunião, em 1996).

"Love Theme from Kiss", uma peça instrumental, é a única música no catálogo do Kiss a ter créditos de composição aos quatro membros originais, e eu devo ser a única pessoa que gosta dela. Foi baseada em um tema que tocava nos shows em boates do grupo em 1973, e é um hard rock bem à la strip club.

"100,00 Years" começa com um riff de baixo de Gene Simmons, e funciona bem ao vivo - a versão incluída em Alive! tem um solo de bateria mais longo do que a versão original. Finalmente, está o clássico "Black Diamond", que figura nos setlists da banda até hoje. Começa com Paul Stanley cantando e tocando uma guitarra de doze cordas, acústica, mas logo a banda inteira entra e Peter Criss assume os vocais. É outra música que funciona muito bem ao vivo, com Eric Carr e Eric Singer cantando no lugar de Peter depois que este deixou a banda.

Kiss é uma banda com uma discografia maravilhosa, mas o brilho e a vivacidade dos álbuns dos anos 1970 nunca serão recuperados. Ao longo desses 40 anos de carreira, a banda criou muito repertório, mas nestes primeiros discos se ouve uma sonoridade simplesmente brilhante, como as letras do logo presentes na capa.


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