Um resumo dos primeiros capítulos de História Social do Jazz
O jazz é um dos mais
notáveis fenômenos culturais do século XX, resultado da fusão da música negra
afro-americana com componentes brancos. O jazz, assim como o blues, teve
origem nas canções de trabalho dos escravos americanos, nas spiritual
songs, na música folclórica da África Ocidental e na fusão com elementos
anglo-saxões, como a língua inglesa e a música gospel dos colonizadores. No
entanto, diferentemente do blues, o jazz incorpora muitos elementos da
música espanhola e francesa.
Em seu extraordinário
livro História Social do Jazz, o historiador Hobsbawm nos ajuda a
compreender historicamente este gênero musical fascinante e pouco
estudado a fundo. Sua obra aborda o gênero desde suas origens, em
1900, sua expansão entre 1920 à 50, bem como o recuo que se deu no fim dos
anos 1950 e a retomada nos anos de 1970 até 1980, principalmente nos Estados
Unidos e Inglaterra.
Assim, ele procura examinar o jazz a partir de um ponto de vista histórico, desmistificando a ideia de que o gênero surgiu exclusivamente do canto dos escravos das plantações do Sul dos Estados Unidos e de que seus músicos, negros, foram avidamente explorados. Esses clichês não deixam de conter algumas verdades, no entanto, a história do jazz é bem mais complexa. Nesta obra, ele tenta mapear as raízes históricas e sociais do gênero, sua e evolução e mutação, a estrutura econômica e técnicas construídas, seu legado, os músicos que o tocam, o público e as razões para seu encanto nos Estados Unidos e no restante do mundo ainda nos dias de hoje.
Assim, ele procura examinar o jazz a partir de um ponto de vista histórico, desmistificando a ideia de que o gênero surgiu exclusivamente do canto dos escravos das plantações do Sul dos Estados Unidos e de que seus músicos, negros, foram avidamente explorados. Esses clichês não deixam de conter algumas verdades, no entanto, a história do jazz é bem mais complexa. Nesta obra, ele tenta mapear as raízes históricas e sociais do gênero, sua e evolução e mutação, a estrutura econômica e técnicas construídas, seu legado, os músicos que o tocam, o público e as razões para seu encanto nos Estados Unidos e no restante do mundo ainda nos dias de hoje.
Fato curioso é que
apesar de Hobsbawm ser lembrado internacionalmente como um historiador
renomado, durante alguns anos de sua vida ele também atuou como jornalista de
jazz, sob o pseudônimo de Francis Newton.
Através de suas
pesquisas e vasto conhecimento sobre o jazz, adquirido também com sua estimada
discografia, o autor busca entender de que maneira o jazz - como
movimento popular negro nascido como um refúgio dos trabalhadores no início do
século XX - conquistou um território geográfico e social com sucesso
mundial, transformando-se em um dos movimentos artísticos de maior
influência na sociedade urbana industrial e tornando-se a linguagem dominante
da música de dança ocidental urbana (embora muito diferente do jazz
autêntico) e canções populares, conquistando inclusive públicos minoritários
europeus. O autor nos mostra que o jazz surgiu em um contexto histórico
específico, investigando os elementos que permitiram seu desenvolvimento e mais
tarde seu isolamento e, mais tarde ainda, sua retomada, examinando suas fases,
desde a origem (em 1900), seu auge nas décadas de 1920 e expansão notável nos
anos pós-depressão de 1929 (30 à 50), seu isolamento de 20 anos e revival nos fins dos
anos 70 e início de 1980.
Para Hobsbawm, o jazz
surge em condições históricas específicas : em nova Orleans, com a música
francesa sendo assimilada cada vez mais por escravos libertos (creoules) e,
mais tarde, também pelos brancos pobres, com o surgimento do entretenimento
profissional dos trabalhadores de classe mais baixas das cidades. A
tradição social francesa católico-mediterrânea de Nova Orleans, com a profusão
de festas públicas, carnavais, marchas com orquestras militares e desfiles (inclusive
fúnebres) criou as condições necessárias para o florescimento do jazz, com uma
demanda constante de bandas, permitindo seu desenvolvimento.
Essa
cultura musical de Nova Orleans permanece viva até hoje, com
desfiles semanais e diversos clubes de jazz, tornando-a certamente uma das
cidades mais interessantes do mundo para os entusiastas do jazz e amantes da
música em geral.
(ver: https://www.youtube.com/watch?v=0y9bhyz0Kno)
Mais tarde, o Grande
Despertar fornece estruturas para a evolução do gênero, com a mescla
sistemática de música africana e europeia nos Estados Unidos, fora
de Nova Orleans
Dessa forma, o autor
pensa em Nova Orleans como o berço do jazz, pois lá e só lá o gênero
surge como fenômeno de massa, pelos motivos citados anteriormente. É
lá que ele surge como entretenimento profissional de trabalhadores pobres e é
nesse contexto que as bandas de jazz começam a se desenvolver (a partir da
tradição metropolitana de entretenimento) com empresários que cada vez mais se
ocupavam desse público, organizando espetáculos em bares. Além disso,
a quebra da cultura escrava tradicional, a decadência dos creoules e
a mistura com negros de castas inferiores também foram a mescla necessária para
o aparecimento da cena de jazz típica de Nova Orleans, muito influenciada pela
música francesa e marchas européias.
Para uma melhor
compreensão, Hobsbawm divide a história do jazz em quatro fases principais: a
pré-histórica de 1900-17 (ragtime); a antiga, de 1917-26 (jazz); o período
médio, de 1929-40 (swing) e a moderna (pop), daí em diante.
Contrariando
explicações que ainda permanecem no imaginário de inúmeros fãs de jazz e música
em geral, o historiador tenta mostrar como o jazz de Nova Orleans se expandiu
desde os seus primórdios, com músicos viajando para outras cidades e até mesmo
para a Europa já em 1907, e com influências que iam desde o ragtime ao blues e
gospel, transformando o dialeto jazzístico. A linguagem do jazz tornar-se-ia
ainda mais expansiva com os movimentos de migração em massa que começaram a
partir de 1916, no qual a população negra do Sul dos Estados Unidos
movimentava-se para as grandes cidades do Norte e Nordeste como Chicago, Nova
Iorque, Filadélfia e Detroit, em busca de melhores condições de vida e empregos
nas indústrias.
Mais além, tenta
também compreender como as empresas de disco se aproveitaram desse mercado em
expansão, criando os race recods, com catálogos voltados para
o público negro e como o impacto do jazz pelo público branco se deu
inicialmente por um jazz nada autêntico, híbrido, típico das danças de salão
(pop, balada). Essa música pop fora influenciada pelo ritmo do jazz e ragtime,
mas muito adaptada com orquestração para dança. Essas misturas também tiveram
repercussão no próprio jazz autêntico e é nesse contexto que surge o saxofone,
por exemplo. Dessa forma, o pop dos anos de 1920
forneceu standarts para o repertório de jazz, principalmente
em conjuntos de brancos e foi esse jazz híbrido que se espalhou pelo mundo todo
com uma rapidez avassaladora, principalmente na Europa, nos anos pós-depressão
de 1929.
A partir de 1930 o
público na Europa já era grande suficiente a ponto de clubes de jazz serem
fundados na Noruega, Dinamarca e Inglaterra e uma série de gravações de jazz
ocorriam na França e Holanda.
Entre 1935-40 a música
pop novamente capitulou o jazz, com o swing, adotando técnicas e arranjos
instrumentais das big bands negras, convivendo também com os
movimentos de revival que apelavam por um jazz mais autêntico,
produto de doutrinas intelectuais que buscavam redescobrir as fontes esquecidas
e puras do jazz e da música folclórica do qual ele originara, com intelectuais
coletando, gravando e cantando sua música com satisfação. Na Inglaterra, um
movimento paralelo ganhava força como um protesto contra tendências mais
comerciais do jazz, com músicos tentando recapturar o jazz quintessencial de
Nova Orleans. Esse purismo fanático fora ainda mais notável em Paris.
O autor também busca compreender como a partir dos anos de 1940 o jazz chega até a
África, conquistando principalmente a África do Sul, também procurando
comprovar como, na década de 50, o jazz já havia se tornado uma linguagem
musical universal.
Ao longo dos primeiros
capítulos o autor mostra como o rock privou o jazz da maioria de seus ouvintes
em potencial nos fim dos anos de 1950 - pois os jovens se atraíam pelo rock
porque encontravam nessa música tudo que procuravam: ritmo, vitalidade
e emoção - e também analisa como as vertentes do próprio jazz (free jazz X
avant-garde X fusion) que estavam surgindo contribuíram para
aumentar a distância entre a música e o público. Também tenta expor
como o rock influenciou o jazz, com inovações tecnológicas e uso constante de
instrumentos elétricos e com o conceito de conjunto e unidade
coletiva no corpo musical; e como a exaustão do impulso musical do rock foi
responsável por manter ainda uma certa presença do jazz nos anos de seu
isolamento (através do fusion com músicos como Chick Corea, Herbie
Hancock, entre outros).
Nesse sentido, ele
analisa a forma pelo qual o jazz traçou dois caminhos: como parte da
cultura e entretenimento popular, influenciando (e sendo também influenciada
pela música pop comercial, como no caso do rock) e como arte isolada, em
oposição à música pop, durante muito tempo sendo relegado a um mundo inferior
das artes oficiais, procurando mostrar como o jazz sobreviveu, com suas diversas
fases e influências e competindo com gêneros musicais que estavam em ascensão.
Como método de
pesquisa e interpretação da história, o autor opta pela Dialética, numa
tentativa de levar em conta tanto o contexto histórico de uma época que
criou condições e estruturas para o florescimento do jazz, bem como as
intenções dos agentes (músicos de jazz e empresários) em transformá-la, ou
impedindo transformações, como no caso de alguns músicos puristas de avant-garde que
buscavam um jazz mais “original”, em meio a cena de um jazz cada vez mais
híbrido.
Hobsbawm pensa
que as estruturas não explicam por si mesmas o desenvolvimento do jazz,
assim como somente as intenções dos músicos e da indústria de discos também não
o explicam. Nos períodos de isolamento do jazz, por exemplo, principalmente
com o sucesso do rock, tudo levava a crer que o jazz estava à beira da
extinção, com seu fim próximo, no entanto, ainda ganhava adeptos e foram
justamente estes os anos de ouro do jazz fusion (mistura do jazz com
outros gêneros, principalmente o rock; ver: "Bitches Bew" do Miles
Davis e "Head Hunders" do Herbie Hancock) .
Dessa forma, o autor
busca um horizonte de compreensão a partir da síntese entre contexto
e intenções, utilizando fontes para tentar entender tanto as estruturas como as
partes (intenções). Fontes estas como estatísticas, periódicos, colunas de
jornais sobre jazz e entrevistas com músicos de jazz e blues. Nesse sentido, busca
não só compreender como o contexto histórico específico norte-americano
permitira o desenvolvimento deste gênero musical tão fascinante, com todas as
suas mutações e oscilações, como também no cenário internacional, tentando
entender, por exemplo, como a depressão de 1929 criou oportunidades necessárias
para a expansão do jazz na Europa.
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